Lei do Silêncio não funciona em Campos

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Sábado e domingo são dias para relaxar e recarregar as baterias. Teoricamente, porque para moradores de alguns bairros de Campos, o fim de semana tem sido um pesadelo. Som alto, palavrões, ronco de motocicletas e total desordem, esse é o saldo do final de semana para habitantes de trechos da Pelinca, Jardim Maria Queiroz e parte da Arthur Bernardes. Com estabelecimentos desobedecendo a Lei do Silêncio e fiscalização ineficaz, os moradores mais uma vez recorreram ao Jornal Terceira Via para clamar às autoridades para que tomem providências. A norma brasileira da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) regulamenta que o ruído em áreas residenciais não deve ultrapassar os limites de barulho estabelecidos – 55 decibéis para o período diurno, das 7h às 20h, e 50 decibéis para o período noturno, das 20h às 7h. A Lei Municipal nº 8061, que regulamenta o Código de Posturas, prevê penalidades para os infratores.

A poluição sonora também é crime, previsto no artigo 54 da Lei de Crimes Ambientais, que especifica que “a poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana” está sujeita a pena de reclusão de um a quatro anos, além de multa.    
Segundo a Prefeitura de Campos, o valor da multa varia conforme a gravidade da infração, e vai de 10% do salário mínimo a dois salários mínimos. No caso de reincidência, a multa dobra.  

No Jardim Maria Queiroz, o som alto não vem de bares e boates. O problema é o pós-festa. Quando o evento termina em um estabelecimento na Rua Pero de Góes, é hora dos carros pararem em frente ao local e ligarem o som, o mais alto possível. Um baile acontece na rua e, além de veículos e pessoas transitando, aparecem muitas motocicletas, e o ronco pode ser nitidamente ouvido pelos moradores das casas e prédios próximos.

Uma moradora de um prédio localizado nesta rua enviou um vídeo para a redação do Terceira Via, no qual é possível ouvir a música, os roncos das motocicletas e tudo o que se passa na rua, mesmo com a janela fechada e o ar condicionado ligado. O detalhe é que essa moradora tem um bebê de quatro meses, que quase não consegue dormir aos sábados, dia em que os eventos acontecem no local.  Ela se queixa da dificuldade de ser atendida pela Polícia Militar e pela Postura Municipal.

“A Polícia Militar quase nunca atende a ligação. Temos inúmeras chamadas não atendidas. E em uma situação em que ligamos e conseguimos falar, o atendente pediu nossos dados e informou que deveríamos comparecer à viatura que enviariam para fazermos um boletim de ocorrência. Não continuamos com a ligação por medo da exposição, afinal de contas as pessoas que estavam praticando as irregularidades ficariam sabendo onde moramos e tudo sobre nós e quem vai garantir nossa segurança? Já a Postura não atende o telefone de madrugada.”, reclama.

Pelinca | Festa na rua é uma das reclamações de moradores dos prédios que ficam no coração da avenida com o IPTU mais caro da cidade

Outra moradora do bairro, uma senhora de 71 anos, relata que é difícil até para assistir televisão. “A gente perde o sono, porque, além da música, tem a gritaria, e já que está acordado pensa em assistir a um programa na TV, ou ver um filme, mas não é possível, porque o vidro da minha janela chega a trepidar com o barulho. Eu tenho que ficar acordada ouvindo o que eles querem (os donos dos carros)”, diz.      

Na rua Maria do Carmo Barreto, transversal à Arthur Bernardes, o pesadelo dos moradores no domingo é um pagode, que começa no final da tarde e vai até 1h da madrugada. “Todos os domingos nos programamos para dormir mais cedo, para iniciar a semana mais descansados, mas o pagode não permite. Além da música alta, os carros são estacionados em frente ao meu prédio e, quando acaba a festa, muitas vezes tem brigas e gritarias. A janela do meu quarto fica de frente para a rua, então é muito difícil dormir antes do evento acabar. Há duas semanas houve uma briga após a festa e não apareceu ninguém para amenizar a situação, que teve até ameaça de tiros”, relata a moradora, que prefere não se identificar.

Velhos problemas na Pelinca

Na avenida Pelinca, os moradores de alguns edifícios vêm relatando os problemas de forma recorrente. O Jornal Terceira Via já denunciou a desordem em matérias feitas em outubro de 2021, dezembro do mesmo ano e em março de 2022, mas, até o momento, as questões permanecem as mesmas. Em um prédio no coração da avenida, muitos moradores inclusive já colocaram seus apartamentos à venda, por não conseguirem conviver com tanto barulho.

Movimentação noturna

“Aqui os moradores antigos todos desistiram, muitos mudaram e colocaram o apartamento para alugar, outros venderam mesmo, porque a baderna começa na quinta-feira. Essa semana, que teve feriado na quarta (Dia de Nossa Senhora Aparecida), desde terça-feira começou a bagunça, e não é só música. Nosso direito de ir e vir também não existe, as pessoas simplesmente param os carros e motos nos portões de garagem. A festa, muitas vezes, se estende para nossa calçada, a impressão que eu tenho é que não tem jeito. Mais do que a gente já ligou para a polícia e já pediu, é impossível. Não adianta passar duas vezes aqui na frente, precisa de uma fiscalização que atue à noite inteira, tanto da polícia quanto da Postura”, diz o morador.

Todas as pessoas que se prontificaram a falar na reportagem, pedindo mais uma vez a atenção do poder público para o assunto, pediram para não ser identificadas, por medo de represálias.  

O que as autoridades dizem

A Polícia Militar disse por meio de nota que as unidades seguem à disposição dos órgãos municipais  para apoiar nas ações que se façam necessárias para coibir tais atividades ilegais. “Vale destacar que essas fiscalizações em estabelecimentos comerciais, bem como ordenamento do trânsito, são da responsabilidade das esferas municipais. Diante de uma  denúncia de perturbação do sossego, equipes policiais são direcionadas ao local para checagem do fato narrado, buscando contato com o reclamante para a condução dos envolvidos à delegacia da área”, diz a nota.

A Polícia Militar ressalta ainda a importância de que a população realize denúncias, pelo telefone do Disque-Denúncia – (21) 2253-1177 – e, para casos urgentes, que faça o acionamento pela Central 190 para que as medidas imediatas cabíveis possam ser tomadas. “Os registros em delegacias da Polícia Civil também são essenciais para que procedimentos investigativos sejam iniciados”, completa a PM.

A Secretaria de Ordem Pública disse por meio de nota que tem atuado com frequência nestes locais e em diversos outros pontos da cidade, orientando e chegando a multar alguns estabelecimentos. A pasta orienta à população que denuncie essas situações pelo telefone / whatsApp do Departamento de Posturas Municipal  98168-3645. No caso de carros de som, a Guarda Municipal pode ser acionada pelos telefones: 153 ou  (22) 98175-0785. A equipe de reportagem questionou aos órgãos municipais quantas multas foram aplicadas, mas não obteve resposta até o fechamento desta edição.

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