Os Ministérios Públicos Federal (MPF), do Trabalho (MPT) e do Estado do Rio de Janeiro (MP/RJ) se uniram para o lançamento de uma inédita Nota Pública Conjunta nesta quarta-feira (26). Em razão do atual cenário de inúmeras denúncias de assédio eleitoral nas relações de trabalho, as três instituições firmaram a Nota Pública por meio de seus representantes locais com atuação eleitoral ou trabalhista – a procuradora regional eleitoral no Rio de Janeiro, Neide Cardoso de Oliveira, o procurador-geral de Justiça do RJ em exercício, Antonio José Campos, e o procurador-chefe em exercício do MPT/RJ, Fabio Goulart Villela.
Na Nota Pública, os representantes e porta-vozes das unidades fluminenses do MPF, MPT e MP Estadual destacaram para as/os eleitores que “o exercício do poder do empregador é limitado, entre outros elementos, pelos direitos fundamentais da pessoa humana, o que torna ilícita qualquer prática que tenda a excluir ou restringir a liberdade de voto dos trabalhadores”.
Ainda no documento, o MPF, MPT e MP/RJ alertaram que eventual tentativa de coagir quadros de trabalhadores neste 2º turno das eleições presidenciais podem configurar práticas de (1) assédio eleitoral e (2) abuso do poder econômico do empregador, podendo seus responsáveis serem processados nas Justiças trabalhista e criminal. No documento, os membros do Ministério Público identificam os tipos penais que eventualmente podem ser imputados aos empregadores aos quais são/serão atribuídas as práticas narradas.
Nota Pública Conjunta sobre o Assédio Eleitoral nas Eleições 2022
“O Ministério Público, instituição incumbida da defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, cumprindo sua missão constitucional, diante do atual cenário de inúmeras denúncias de Assédio Eleitoral nas relações de trabalho, vem a público informar e alertar a população de que é ilícita qualquer prática que objetive excluir ou restringir a liberdade de voto dos trabalhadores.
Neste sentido, o Ministério Público Federal, pela Procuradoria Regional Eleitoral no Rio de Janeiro, o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro e o Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro vêm a público manifestar que o exercício do poder do empregador é limitado, entre outros elementos, pelos direitos fundamentais da pessoa humana, o que torna ilícita qualquer prática que tenda a excluir ou restringir a liberdade de voto dos trabalhadores.
Portanto, ameaças a trabalhadores para tentar coagir a escolha em favor de um ou mais candidatos ou candidatas podem ser configuradas como prática de assédio eleitoral e abuso do poder econômico do empregador, passíveis de medidas extrajudiciais e/ou judiciais na esfera trabalhista e criminal.
Mais do que violações das normas que regem o trabalho, a concessão ou a promessa de benefício ou vantagem em troca do voto, bem como o uso de violência ou de coação para influenciar o voto são crimes eleitorais, previstos nos artigos 299 e 301, ambos do Código Eleitoral.
A República Federativa do Brasil é um Estado Democrático de Direito, que tem por fundamentos, dentre outros, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e o pluralismo político (CRFB/1988, art. 1º, incs. II, III, IV e V);
A tutela da dignidade da pessoa humana pressupõe a efetivação dos direitos fundamentais nas relações privadas, incluindo as de trabalho.
O ordenamento jurídico pátrio resguarda a liberdade de consciência, de expressão e de orientação política (CRFB/1988, art. 1º, incs. II e V; 5º, incs. VI e VIII), protegendo o livre exercício da cidadania, notadamente por meio do voto direto e secreto, que assegura a liberdade de escolha de candidatas ou candidatos, no processo eleitoral, por parte de todas as pessoas cidadãs.
A utilização do contrato de trabalho para o exercício ilícito de pressão ou obstaculização contra direitos, interesses ou vontades do empregado é prática que viola a função social do próprio contrato, prevista como baliza para os atos privados em geral, vide o art. 5º, inc. XXIII e o art. 170, inc. III, ambos da Constituição Federal.
O poder diretivo do empregador não pode impedir jamais o exercício dos direitos de liberdade, não discriminação, expressão do pensamento e exercício do voto, sendo que o abuso do poder diretivo viola o valor social do trabalho, estabelecido como fundamento da República no art. 1º, inc. IV, previsto como direito social fundamental nos arts. 6º e 7º, e como fundamento da ordem econômica – art. 170, caput – e base da ordem social – art. 190 -, todos da Constituição Federal.
A concessão ou promessa de benefício ou vantagem em troca do voto, bem como o uso de violência ou ameaça com o intuito de coagir alguém a votar ou não votar em determinado(a) candidato(a), como dito, configuram atos ilícitos e fatos tipificados como crimes eleitorais, conforme artigos 299 e 301 do Código Eleitoral.
O artigo 297 do Código Eleitoral tipifica como crime, cominando pena de detenção de até seis meses, o ato de “impedir ou embaraçar o exercício do sufrágio”.
O artigo 237 do Código Eleitoral prevê que “a interferência do poder econômico e o desvio ou abuso do poder de autoridade, em desfavor da liberdade do voto, serão coibidos e punidos”.
Além de crime eleitoral, as práticas acima citadas configuram assédio eleitoral laboral, e ensejam a responsabilização do (a) assediador (a) na esfera trabalhista.
O(a) empregador(a) tem o dever de conceder o período necessário para que o(a) empregado(a) possa votar, sem efetuar quaisquer descontos na remuneração do(a) trabalhador(a).
O voto, direto e secreto, é um direito fundamental do cidadão protegido pela Constituição Federal como livre exercício da cidadania, da liberdade de consciência, de expressão e de orientação política. Portanto, cabe a cada eleitor tomar suas próprias decisões eleitorais baseado em suas convicções ou vontades, sem ameaças ou pressões de terceiros.
O Ministério Público Federal, pela Procuradoria Regional Eleitoral no Rio de Janeiro, o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro e o Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro reafirmam seu compromisso de garantir que os direitos fundamentais do trabalhador sejam respeitados, em conformidade com a legislação em vigor e informa que todas as denúncias de assédio eleitoral serão apuradas com rigor e encaminhadas às autoridades competentes para a apuração dos crimes correlatos
Rio de Janeiro, 26 de outubro de 2022
Neide M. C. Cardoso de Oliveira
Procuradora regional eleitoral no Rio de Janeiro, MPF
Antonio José Campos
Procurador-Geral da Justiça em exercício, MP/RJ
Fabio Goulart Villela
Procurador-Chefe em exercício, MPT/RJ”.