Por meio de uma carta aberta, o Hospital Psiquiátrico Doutor João Viana anunciou nesta segunda-feira (10)o encerramento das atividades em Campos dos Goytacazes após 75 anos. O hospital alega que, devido a problemas financeiros, “manter um atendimento digno aos pacientes, assim como garantir condições dignas de trabalho aos funcionários, tornou-se uma missão insustentável”, diz o trecho de um comunicado enviado à imprensa pela diretoria da instituição, que é dirigida pela Liga Espírita de Campos.
O comunicado desta segunda não especifica a data que será encerrada totalmente as atividades na unidade. A reportagem fez contato com a instituição que estava hoje funcionando normalmente. A diretoria afirma também que “os pacientes atendidos pela instituição encontram-se em condições de continuar o tratamento junto aos seus responsáveis (municípios e familiares), através de outros equipamentos e recursos disponibilizados pelo poder público” diz outro trecho da nota.
A reportagem do Jornal Terceira Via entrou em contato com a direção do Hospital Psiquiátrico Doutor João Viana para saber como se dará a saída dos pacientes da unidade; se esta decisão é irreversível; e se o poder público municipal poderia auxiliar na preservação do atendimento. A Secretaria Municipal de Saúde também foi procurada, mas até a publicação desta reportagem não houve respostas de ambos.
Confira a carta aberta assinada Liga Espírita de Campos
“A vida é uma constante evolução. Ciclos se encerram para que outros tenham início. É assim também com o Hospital Psiquiátrico Dr. João Viana.
Fundado por voluntários, há 75 anos o estabelecimento de saúde presta relevantes serviços ao município de Campos e região, acolhendo sobretudo irmãos e irmãs com transtornos mentais que não têm recursos financeiros para pagar por um atendimento particular.
Nos últimos anos, no entanto, manter um atendimento digno aos pacientes, assim como garantir condições dignas de trabalho aos funcionários, tornou-se uma missão insustentável.
A política antimanicomial adotada por governos nas esferas federal, estadual e municipal sufocou financeiramente a instituição, que tem como única fonte de renda o repasse do Sistema Único de Saúde (SUS) via Autorizações de Internação Hospitalar (AIH) – uma diária paga ao final do mês de acordo com o número de pacientes internados.
Ocorre que o valor da AIH (paciente/dia) jamais cobriu nem a metade das despesas, que incluem o pagamento dos salários dos funcionários, serviços de hotelaria, alimentação, limpeza, vestuário e manutenção. Graças ao apoio da comunidade campista e sociedade civil organizada, que sempre se fizeram presentes nos momentos mais difíceis, há mais de cinco anos a alimentação dos pacientes é mantida por doações.
A situação financeira se agravou na gestão municipal 2017/2020, quando foram envidados todos os esforços possíveis para fechar o hospital, evitando a internação de pacientes por meio do PU Psiquiátrico Saldanha Marinho (atualmente Salo Brand). Sem internação e consequentemente com menos recursos recebidos via AIH, mas obrigado a manter seu corpo funcional, o hospital se viu em situação de colapso financeiro.
Nesse período, vários funcionários se demitiram por rescisão indireta, ingressando na Justiça do Trabalho com reclamações trabalhistas em busca de seus direitos (salários atrasados, férias e 13o salário). Estas Reclamações Trabalhistas têm sido executadas em 2021/2022, com constantes bloqueios judiciais na conta corrente da instituição, que agravaram sobremaneira a situação salarial dos funcionários que permaneceram na instituição.
Por estes motivos, tornou-se inviável, por ora, a manutenção da instituição. Assim sendo, o Hospital Psiquiátrico Dr. João Viana vem a público informar que estarão suspensas quaisquer internações por tempo indeterminado. Todos os pacientes atendidos pela instituição encontram-se em condições de continuar o tratamento juntos aos seus responsáveis (municípios e familiares) através de outros equipamentos e recursos disponibilizados pelo poder público.
O hospital agradece imensamente a todas as pessoas que de alguma forma estiveram presentes ao longo de seus 75 anos, através do trabalho (remunerado ou voluntário), doações ou orações em favor dos pacientes e seus familiares.
Depois de muita luta, um ciclo se fecha, com a sensação de dever cumprido. Mas fica a certeza de que novos trabalhos virão pela frente. Acima de tudo, continua o desejo de servir, tendo a caridade como princípio maior, conforme as palavras e o exemplo de Jesus”.